O Pop de Chico Mazzoni

Depois das tentativas efêmeras do final do milênio passado em nome do novo, a partir dos 90 a pintura voltou restabelecida, agora sob a chancela do estilo exclusivo e da imprescindível qualidade. Um bom quadro, executado por alguém que além do domínio do oficio deixa transparecer suas emoções, está sempre dizendo alguma coisa seja à mente, aos sentimentos ou simplesmente aos olhos do espectador, como nessas 23 telas da recém-terminada fase de Chico Mazzoni.

Enquanto na arte Pop dos 50/60 os artistas contrariavam o classicismo elitista da arte, usando os objetos comuns do cotidiano como motivos, nessa época das celebridades passageiras que o próprio Warhol prognosticara, as imagens que atraem Chico Mazzoni vão da clássica antiguidade da mitológica Loba Romana aos atualíssimos piercings e tatuagens.

No seu estilo realista o artista elegeu as imagens mais populares, reconhecidas por todos pelo mundo afora. É exatamente o desafio de apresentá-las hoje atendendo às exigências do olhar atual que o artista encara, criando em torno da força de cada uma, sem ferir a qualidade original, exaltada no difícil domínio da técnica que usa.

CM une com eficiência o pontilhismo favorecido pela tinta dimensional aos recursos da pintura, e cria soluções exatas para apresentar cada motivo situando-o no tempo e carregando na intenção. São imagens fortes associadas a lugares, costumes, religiões, até certas ocorrências inconcebíveis que ficaram gravadas na memória coletiva: bomba atômica, torres gêmeas, tsunami. A atração dessas imagens populares se amplia nas evocações que elas despertam.

O Cristo ‘art deco’ alvo, perolado, destacando-se do azul turquesa das asas de borboleta – relíquia fulgurante do artesanato comum na época – nos remete ao esplendor do Rio nos anos 40, 50, ostentando sua beleza na Baía da Guanabara, refulgindo suas cores nas pedras do Pão de Açúcar, um Rio ainda sem traficantes e balas perdidas.

Nas Burkas ocultas sob panos em pleno século XXI, o artista cria pertinente arabesco que acentua o mistério, enquanto nas cores esmaecidas do leão da MGM, passa a nebulosidade dos primeiros filmes da sua infância, revelando que essa atração pelas imagens vem de muito tempo.

Na irrepreensível qualidade das telas dessa mostra, a re-interpretação do David desenhado em grafite, depois pincel e tinta dimensional, entre o branco e preto dos clássicos mosaicos italianos, é um sensível tributo a Michelangelo, sem desmerecê-lo.

Matilde Matos  (ABCA/AICA)